Cinema Paradiso


Giuseppe Tornatore realizou o sonho de um grande número de cineastas ao produzir com seu "Cinema Paradiso" uma verdadeira declaração de amor. Não se trata de mais um filme romântico bem-sucedido, nem tampouco de um clássico do porte de "Casablanca" em que Ingrid Bergman e Humprey Bogart imortalizaram o Marrocos e nos deixaram enternecidos em função de seu romance. Tornatore notabilizou-se por ter feito um filme que sacramenta a paixão que os cineastas sentem por seu objeto de trabalho, pela essência de seu cotidiano, pela arte que brota através das câmeras em celulóides, por aquilo que nos permite vivenciar e fantasiar emoções ao redor do mundo todo, o cinema.
Poucos foram os "movie-makers" capazes de tal empreitada. Talvez Woody Allen com o fantástico "A Rosa Púrpura do Cairo" também tenha conseguido nos fazer sentir um pouco aquilo que alimenta as esperanças e as emoções de quem está por trás das filmagens, tão diretamente ligado a todo processo de realização dos filmes. Porém, diferentemente da fantasia dos personagens que saem da tela apresentada em "A Rosa Púrpura", o filme italiano nos fala sobre a relação cineasta-cinema de forma notadamente auto-biográfica.


A trama começa com o menino Totó, numa Itália abalada pela guerra. O próprio personagem sofreu um revés irreparável, seu pai foi enviado para os campos de batalha e não voltou. Orfão de pai, vivendo apenas sob a tutela da mãe, Salvatore (numa performance digna de nota do menino Salvatore Cascio) tem uma grande paixão e, como todas as pessoas envolvidas em situações como essa, arrisca-se diversas vezes para que esse amor seja vivido com intensidade. Em algumas ocasiões utiliza o dinheiro que a mãe lhe deu para comprar mantimentos, realizando seus sonhos, encontrando-se com seu ardente desejo, indo ao cinema, vendo os filmes. Totó é um amante da sétima arte.
Nessas idas e vindas ao Cine Paradiso, Totó acaba, por vias tortas, tornando-se amigo do projecionista Alfredo (Philipe Noiret, em mais uma marcante atuação) e sacia seu desejo de poder assistir aos filmes da cabine de projeção. A cidade onde vive é uma pequena comunidade, de aspecto rural, onde há poucas possibilidades de lazer. Como região interiorana, de país de tradições religiosas arraigadas, o padre acaba tendo grande eminência entre as pessoas que ali vivem. Mesmo no cinema o clérigo interfere, censurando cenas que apresentem beijos ou que denotem minimamente a noção de sexualidade. As cenas cortadas em virtude do conservadorismo do padre tornam-se então brinquedos festejados nas mãos de Totó.



Alfredo por sua vez, além de artífice dos sonhos como projecionista do cinema, torna-se também (em razão do convívio e da grande proximidade) um segundo pai para o menino. Procura orientá-lo e ensina os procedimentos do trabalho que exerce para o garoto. Há situações que fazem com que eles se tornem ainda mais próximos, como quando Totó ajuda Alfredo a aprender a ler e escrever ou ainda, quando o Paradiso pega fogo. O incêndio acaba fazendo com que Alfredo fique cego e, que Totó torne-se o novo projecionista do cinema local. Consuma-se com maior voracidade o envolvimento do agora jovem Salvatore (vivido por Marco Leonardi) com os filmes.
O passar do tempo e o advento da maioridade fazem com que seja necessário um rompimento. O que poderia parecer o fim de um sonho, acaba concretizando um casamento definitivo entre o garoto/adolescente/jovem Totó com o cinema. Ele torna-se um realizador, um cineasta. De admirador das imagens em preto e branco que povoaram sua meninice e sua adolescência, de colecionador de fotogramas censurados pelo padre, de projecionista do Paradiso em sua cidade de origem, Salvatore acabou se tornando um produtor de sonhos. Suas imagens passam a partir de então, a encantar milhares de pessoas em seu próprio país e fora dele.
O início do filme nos mostra Totó adulto, recebendo notícias de sua cidade natal e tendo que voltar para lá. Há muito tempo saíra de lá e, pouco comunicava-se com sua mãe ou com outras pessoas que ali permaneceram. Parecia querer esquecer-se do que havia vivido (talvez em decorrência de uma outra paixão que ali tivera, nesse caso, mal resolvida). No entanto, algo o levou a voltar. E com a volta, vieram as lembranças; com toda a nostalgia que o ambiente lhe proporcionou, contou-se essa verdadeira fábula contemporânea.


"Cinema Paradiso" nos permite acreditar que apostar em nossos sonhos e paixões pode dar grandes lucros e dividendos a médio e longo prazo. Há muitos jovens que abraçam formações e profissões que podem lhes garantir melhores salários, maior prestígio ou mais conforto em suas vidas materiais. Conheço diversos casos assim, em que carreiras como o direito, a medicina, a engenharia ou a odontologia (nada contra elas, pelo contrário, são fundamentais; o que se advoga aqui é que elas não sejam adotadas simplesmente por constituírem melhores alternativas econômicas para os jovens estudantes) são as preferidas não por serem estimulantes ou atraentes para os estudantes, são escolhidas em virtude de fatores como dinheiro ou status. O que temos como resultado acaba sendo o surgimento (em muitos casos) de profissionais eficientes, capazes porém... frustrados.
 


Há dificuldades em implementar carreiras em artes cênicas, filosofia ou oceanografia? Ganha-se pouco sendo historiador, músico ou professor? Ainda existem restrições de (e no) mercado quanto ao trabalho de veterinários, psicólogos ou arquitetos? Se esse for seu sonho ou sua grande paixão, a despeito das dificuldades, vá em frente. Derrote as adversidades, olhe-as nos olhos e mostre que sua força é maior, que seu vigor o fará vencer. Nós, professores passamos por provações como essas em diversas fases de nossa vida profissional, alguns desistem, outros, persistem e vencem. Que o exemplo da persistência de Totó nos anime. Que o amor pelo cinema mostrado em "Cinema Paradiso" seja uma luz a nos guiar para a realização dos nossos desejos! Assista e emocione-se!

 


Ficha Técnica
Cinema Paradiso
(Nuovo Cinema Paradiso)
País/Ano de produção: Itália, 1988
Duração/Gênero: 123 min., drama
Disponível:- VHS e DVD
Direção de Giuseppe Tornatore
Roteiro de Giuseppe Tornatore
Elenco: Philipe Noiret, Salvatore Cascio, Marco Leonardi,
Antonella Atilli.

 

 

 


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