Participações do educador
português na TEIA refletem sobre necessidade de uma
pedagogia mais humana, a partir das experiências da Escola
da Ponte, em Portugal.
Elisangela Oliveira*
Élcio Paraíso
Em conferência realizada na
manhã desta sexta-feira (11) e em mesa da qual participou na
tarde deste mesmo dia, no Seminário Internacional Saberes
Vivos, o educador português José Pacheco expôs os princípios
da pedagogia desenvolvida pela Escola da Ponte (EP), uma
iniciativa libertária dentro do sistema de ensino
conservador de Portugal. O educador português transformou
seu sonho de uma escola que fuja do modelo tradicional em
realidade, e veio para o Brasil, onde mora hoje, contribuir.
Pacheco trabalhou sua conferência numa ótica
problematizadora freiriana, através de uma conversa aberta e
respondendo a perguntas sobre o que foi a Escola da Ponte, o
que é hoje e as experiências realizadas fora dela, sobre o
que declarou que “temos uma relação complexa com outras
escolas, conheci algumas escolas inspiradas na Ponte”.
Algumas, como a escola Amorim Lima, no bairro do Butantã, na
cidade de São Paulo, quase foi destruída com o conhecimento
público, graças à intervenção da mídia, através do
“malandreco do Gilberto Dimenstein”. O professor ressalta
uma peculiaridade do brasileiro: além de ingrato com as
inovações, é ingrato com seus intelectuais, como Eurípedes
Bassanufo, Augustinho da Silva e Lauro Oliveira Lima,
inovadores em suas pedagogias.
Em sua metodologia, a EP não segue um sistema baseado em
seriação ou ciclos e seus professores não são responsáveis
por uma disciplina ou por uma turma específica. Suas
crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, chegam em sua a
maioria violentos, transferidos de outras instituições, se
agrupam de acordo com os interesses comuns para desenvolver
projetos de pesquisa, e dessa forma aprendem. Não há salas
de aula, e sim lugares onde cada aluno procura pessoas,
ferramentas e soluções, testa seus conhecimentos e convive
com os outros. São os espaços educativos.
Crítico, Pacheco destaca que “não é fácil para as crianças
se integrarem as regras da Escola da Ponte, há crianças e
jovens que chegam e não sabem o que é trabalhar em grupo.
Não conhecem a liberdade, e sim confundem com libertinagem.
Não sabem o que é solidariedade, somente a competitividade.
São ótimos, mas ainda não têm a cultura que cultivamos.
Quando deparam com a possibilidade de definir as regras de
convivência que serão seguidas por todos, ou não decidem
nada, ou o fazem de forma pouco ponderada. Em tempos de
crise, como agora, em que muitos estão nessa situação,
precisamos ser mais diretivos, utilizando a autoridade que
nos é dada como professores”.
A participação dos pais, mais profunda do que em um simples
Conselho, é em todas as decisões, e inclui a defesa da
escola perante o governo, que ao longo dos 30 anos do
projeto várias vezes se prostrou contrário à continuação do
projeto. Além da pressão governamental, Pacheco afirmou que
o modelo “sofre grande resistência de aceitação por parte
das escolas portuguesas”, em parte por se basear em três
grandes valores: a liberdade, a responsabilidade e a
solidariedade. O apoio, em compensação, veio de diversos
outros países.
A persistência deu resultado: “A Ponte é uma escola pública,
mas sua racionalidade e prática nada têm a ver com o modelo
de escola pública instituído”. Criticou ainda o mito que o
educador Rubem Alves, ao conhecer o projeto, erigiu, “com
seu olhar poético”, em seu “Escola que sempre sonhei”. O
mito era que se tratava de um ambiente e de uma pedagogia
perfeitos, e não o são. A EP também possui problemáticas,
não é esse conto de fadas. Criticou ainda as soluções dos
acadêmicos, que ensinam o que não fazem.
Outra questão colocada por Pacheco é que um dos problemas
está na formação de professores, no modo como ele aprende,
pois como se aprende é como se ensina. Nossos professores
passaram por uma escola que não inclui, e isso gera um
círculo vicioso, cuja solução deve surgir na base, com apoio
do poder político, respaldo das universidades e práxis
atuante. De forma semelhante, os projetos políticos
pedagógicos não são trabalhados como deveriam, e há escolas
nas quais há ação e não existe projeto, assim como o
contrário. E falta, em muitos casos, coerência, embora ela
exista sim.
A grande força do projeto, em sua visão, é a de que se
tratava de uma pedagogia eclética, por adotar contribuições
de diferentes origens, modelos, autores, correntes. “É nossa
convicção que um projeto só poderá encontrar sentido e
sustentabilidade se for escorado numa permanente
interrogação das suas práticas e escapar à vertigem de
fundamentalismos pedagógicos”, disse o educador, e
complementou: “Nada foi inventado na Escola da Ponte. Quando
percebemos que precisávamos mais de interrogações que de
certezas, definimos como objetivos: concretizar uma efetiva
diversificação das aprendizagens tendo por referência uma
política de direitos humanos que garantisse e promovesse a
autonomia e a solidariedade; intensificar a cooperação,
responsabilidade”.
* Colaborou Guilherme Jeronymo, 100canais
|